Trinta e três congressistas que não exerceram sequer um dia de mandato custaram mais de R$ 10 milhões à Câmara e ao Senado. E seus suplentes custaram outros R$ 12 milhões
Edson Sardinha, no Congresso em Foco
No primeiro ano da atual legislatura, 33 parlamentares (5% dos 594 congressistas) não exerceram sequer um dia do mandato para o qual foram eleitos. Eles se licenciaram logo depois da posse e passaram todo o restante de 2011 fora do Congresso, no comando de secretarias e ministérios. Mas, mesmo exercendo funções no Executivo, esses 31 deputados e dois senadores continuaram recebendo do Legislativo. E apenas esse grupo de secretários e ministros recebeu R$ 10,5 milhões em salários da Câmara e do Senado no ano passado.
Além de um eventual conflito de interesse e da distorção da vontade do eleitor – que vê seu candidato não exercer o cargo para o qual foi eleito –, o afastamento desses parlamentares gerou, ainda, um ônus extra ao Congresso: além de pagar os R$ 10,5 milhões aos licenciados, a Câmara e o Senado gastou mais de R$ 12 milhões com os vencimentos dos 33 suplentes convocados para substituí-los.
No total, a conta repassada ao contribuinte, porém, é ainda maior. E difícil de ser calculada. É que, além dos 33 que passaram todo o ano fora, outros 28 congressistas se revezaram entre o Legislativo e o Executivo em 2011. Ou seja, durante todo o ano, 61 deputados e senadores (11% dos integrantes do Parlamento) se licenciaram para responder por secretarias e ministérios. Atualmente, 41 deputados e cinco senadores exercem funções fora do Congresso: dez são ministros e 36, secretários estaduais. Quatro deles assumiram as novas funções neste começo de ano.
A Constituição Federal garante ao parlamentar licenciado o direito de trocar livremente de Poder. E, o melhor para deputados e senadores: permite que eles escolham a fonte pagadora – o próprio Congresso ou o órgão ao qual está vinculado. Como os rendimentos dos congressistas superam, de longe, os recebidos pelos secretários estaduais e municipais, a quase totalidade deles opta por continuar recebendo os R$ 26,7 mil da Câmara e do Senado. A discrepância só não existe no caso dos ministros, que, desde o início de 2011, recebem remuneração igual à dos parlamentares. O único prejuízo para o licenciado é receber 13 em vez dos 15 salários anuais pagos a quem está no exercício do mandato.
De todos os 65 congressistas que se licenciaram nesta legislatura, apenas o deputado Sérgio Zveiter (PSD-RJ), atual secretário estadual do Trabalho, abriu mão dos vencimentos no Congresso. “Por estar prestando serviço no estado, achei correto receber o valor correspondente ao local onde estou exercendo a função”, afirma. Como secretário, Zveiter conta que recebe R$ 12,9 mil brutos – menos da metade do que ganharia se tivesse optado pelos rendimentos da Câmara.
Congresso em Foco: PPS quer que parlamentar renuncie para assumir outro cargo
Pela proposta, os deputados e senadores terão de abrir mão do mandato para ser secretário ou ministro. Licenciados resistem à mudança
A facilidade com que os parlamentares brasileiros trocam o Legislativo pelo Executivo começa a ser questionada na Câmara. O PPS tenta emplacar na reforma política uma proposta que obriga o congressista a renunciar ao mandato se quiser ser ministro ou secretário.
"Tem de abrir mão de um poder porque vai exercer outro. Ninguém pode ser advogado de acusação e defesa", diz o deputado Sandro Alex (PPS-PR), que encabeça, em nome do partido, a sugestão de mudança nas regras do jogo. "Isso compromete uma das principais atribuições do parlamentar que é fiscalizar o Executivo", completa o paranaense. A proposta de alteração será analisada pelo relator da reforma na Câmara, deputado Henrique Fontana (PT-RS).
A mudança, porém, enfrenta resistência de parlamentares licenciados. "É uma proposta natimorta e absurda", reage Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR), atual secretário da Fazenda do Paraná. Na avaliação dele, todos ganham com a participação de políticos eleitos em cargos do Executivo. "Sou parlamentarista, quero que 100% dos ministérios e das secretarias sejam ocupados por parlamentares. Os quadros seriam muito melhores, porque todos passaram pelo teste da população", acredita.
O deputado licenciado diz que optou por continuar a receber da Câmara por ter essa prerrogativa garantida pela Constituição. Ele qualifica a proposta do PPS como uma tentativa de "americanização" do sistema representativo brasileiro. Nos Estados Unidos, o parlamentar tem de renunciar ao mandato para integrar o Executivo. Foi isso que aconteceu, por exemplo, com a atual secretária de Estado, Hillary Clinton, que renunciou a uma cadeira no Senado para assumir o segundo cargo mais importante do governo norte-americano. "Só que lá tem voto distrital, bipartidarismo e mandato de dois anos. São características completamente diferentes daqui", afirma Hauly.
Pensando duas vezes
O secretário admite que "pensaria duas vezes" se fosse obrigado a renunciar ao mandato para assumir um cargo no governo. "O mandato é uma conquista do partido. Teríamos de conversar", diz. Já o secretário estadual do Trabalho do Rio de Janeiro, o deputado licenciado Sérgio Zveiter, é taxativo quando questionado sobre o assunto: não teria assumido o novo posto se fosse obrigado a renunciar ao mandato.
Zveiter admite que aceitou interromper seu primeiro mandato federal para proporcionar um arranjo político. "Foi para atender a um pedido do governador Sérgio Cabral, solicitado pela presidenta Dilma Rousseff, para possibilitar, por um período, a permanência do Leonel Brizola na Câmara. Tive a certeza de que poderia ajudar ao meu estado e, em particular, ao meu município de Niterói", explica. O secretário deve voltar à Câmara até a próxima semana, quando acaba o prazo para quem tem pretensão de disputar as eleições de outubro se afastar das funções de secretário e ministro. Zveiter é pré-candidato à prefeitura de Niterói.
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